' Falta tanta coisa na minha janela como uma praia, falta tanta coisa na memória como o rosto dele*, falta tanto tempo no relógio quanto uma semana, sobra tanta falta de paciência que me desespero. Sobram tantas meias-verdades que guardo pra mim mesma*, sobram tantos medos que nem me protejo mais, sobra tanto espaço dentro do abraço, falta tanta coisa pra dizer que nunca consigo..

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Obrigada!

Te encontrava em todos os cômodos, em todos os cantos. Nos pares de meia largados no chão, tão sem combinação quanto eu. Largados, amassados, sujos e esquecidos, e não existiria metáfora melhor para falar de mim neste momento. 

- Doutora, isso passa? 
- Nem tudo passa. 

E foi um baque descobrir que tem ferida que abre e corta tanto que leva um pedaço da gente, tem ferida de todo tipo e tanta gente ferida por baixo da roupa que nem dá pra perceber quando se esbarra numa delas pela rua. 

Eu tava meio despedaçada. Desesperada mesmo. Numa loucura indigna, mas com um quê de drama-psicológico que me faltou ar. Me faltou ar por conta da pressão e da altitude. Achava que tudo na vida passava e foi um baque, como já disse, quando soube que a dor tinha estacionado. Parado bem na minha frente e me atingido numa baliza perfeita. Nem deu tempo de me despedir quando saía do chão e engolia poeira. 

- Doutora, adianta anotar a placa do veículo? 

Você foi aquela quase-coisa-que-deu-certo, sabe? Que me prende no “e se…”, que eu nunca vou saber porque foi feita uma escolha voluntária e acabou. Aquele meu quase-amor que dói mais do que se tivesse sido, porque me arrancou de mim. E você não me segurava, e me dizia com todas as letras que eu não era a ultima mulher do mundo, e que podia ir embora se quisesse. 

Será que a gente aprende a dirigir outra vez? Digo, não no sentido literal da coisa. Mas quanto tempo demora pra passar algo que não passa? Pra sempre é tempo demais, mesmo que tivessem me cortado o acelerador e eu tivesse que empurrar o carro. 

No fundo, eu entendi que era tudo uma questão de visão: não tem “e se…”, porque você foi. Sem prestar condicionalidade ou oferecer proposta. Você foi e pronto, acabou. A gente é que tem essa mania de estender a história pra tentar se sentir bem depois que é abandonado. Pra encher a cabeça e fingir que ainda vive aquilo. Ou pior: pra provar que você nem sempre foi assim e que se importava, sim, comigo. Mesmo que tudo indique e negue isso. 

Daí eu retomo os fatos e me lembro, de novo, de você reclamar de eu nunca ter te agradecido. E vejo as faltas, vejo os lapsos, vejo como você nem me fazia tão bem assim. Vejo aquela dependência e me pergunto como eu podia considerar que era amor alguém que vai (embora) sem a menor consideração com você? Se não existiu consideração pelo que se viveu, se o outro já nem ligava. E eu lá vou me matar, me envenenar, me tratar com dó como se você merecesse isso? 

E eu, que sempre fui a mimada pra você, que nunca soube ser compreensiva, que sempre fui a egoísta. Eu que recebi tantos tapas enquanto tentava te dar meus braços. Que passei por cima de tanta coisa, pra ter você aqui. As noites mal dormidas enquanto lutava pra trancar o teu fantasma aqui dentro (da casa e de mim), queria que você entendesse, queria que você ficasse, e não percebia o controverso estado em que estava. Se queria que tudo isso passasse, por que aprisionar uma projeção bonita de você que nunca existiu?

Foi bem melhor pra mim. 
E agora eu agradeço pela melhor coisa que você fez por mim: obrigada (por ter me deixado).


Nenhum comentário:

Postar um comentário